OPA! Tudo bem pessoal?
Aproveito a ocasião, uma Black Friday, para postar integralmente um artigo muito interessante publicado no jornal Extra Classe, do SINPRO – MG, em dezembro de 2012, mas ainda bem atual. Uma análise bem interessante mesmo, vale a pena ler e refletir. Boa leitura!
Sociedade consumista
Diante dos impactos do hiperconsumo, ações educativas são bem-vindas.
“O consumismo descarta nossos modos naturais humanos de exibir características e nos mantém ocupados demais trabalhando para consumir sempre mais”.
Esse pensamento do psicólogo Geoffrey Miller, professor da universidade do Novo México (EUA), traduz a realidade vivida hoje por milhões de pessoas no Brasil e no mundo. Acordar cedo, correr para o trabalho e se esforçar muito para ganhar dinheiro. Depois de tanto correr, é hora de comprar e gastar, vestir roupas da moda, portar novos acessórios, e assim estar ”pronto” para o convívio social, superficial. Repletos de bens de consumo e exaustos no outro dia, é preciso trabalhar mais para pagar as contas das compras feitas, e assim gira a roda do capitalismo.
“O consumo é um fenômeno social, cultural, de troca. No tempo em que vivemos, consumir é imperativo. É como se não existisse a possibilidade de não consumir”,
destaca Laura Guimarães Corrêa, doutora em Comunicação, professora e coordenadora do GrisPub – Grupo de Pesquisa em Publicidade, Mídia e Consumo da UFMG. Para ela, o consumo é uma espécie de identidade na atualidade.
“As pessoas consomem para fazer parte de um grupo social, para serem reconhecidas como sujeitos capazes de consumir, e ainda como recompensa ou merecimento diante das dificuldades cotidianas”, alerta.
O momento atual é também conhecido como Sociedade do Consumo. Em uma avançada etapa de desenvolvimento industrial capitalista, essa sociedade se caracteriza pelo consumo massivo de bens e serviços, disponíveis graças a sua elevada produção. Esse desenvolvimento, que alterou os padrões de consumo, no entanto, trouxe fortes impactos para o mundo em que vivemos. Desequilíbrio populacional, destruição do meio ambiente, pobreza estrutural, desigualdade social, violência, mudanças de valores e comportamentos, materialismo são alguns dos problemas a serem enfrentados na atualidade.
Felicidade inatingível.
Um dos pilares da sociedade do consumo é a publicidade, que se cria necessidades e potencializa desejos. De acordo com a professora Laura Corrêa, as pessoas consomem mais por desejo do que por necessidade.
“A publicidade se apropria disso e, a partir de diferentes estratégias discursivas, tenta promover a satisfação imediata dos desejos através do consumo. No entanto, a satisfação de um desejo é só o início de um novo desejo, pois se os bens satisfizerem quem os consome, o sistema capitalista não se sustenta”, destacou.
De acordo com o professor Ricardo Teixeira da Veiga, doutor em Administração e pesquisador do Núcleo de Estudos do Comportamento do Consumidor da UFMG, as necessidades e desejos muitas vezes são construídos pelas próprias empresas.
“A pessoa passa a consumir pelo signo, pelo simbólico, não pelo valor de uso do produto”, destaca.
Para Renata Livramento Mendes, psicóloga e doutoranda em Administração e Marketing, devemos pensar nos nossos valores para então fazer escolhas de consumo, ao invés de atribuir valor ao que consumimos. Segundo ela, essas contradições caracterizam o nosso tempo, em que se cultua um ideal de felicidade inatingível.
“As sociedades estão cada vez mais ricas, ao mesmo tempo em que há um número crescente de pessoas que vivem na precariedade de recursos. Há também um grande número de pessoas que sentem uma falta constante, mesmo consumindo. Perseguem o ideal de uma felicidade plena, que não existe. Existem momentos felizes que se somam”, pontua.
Hiperconsumo.
Já se nomeia essa época de intensa busca pela satisfação dos desejos como Sociedade do Hiperconsumo. Para Gilles Lipovetsky, professor de Filosofia na Universidade de Grenoble (França), essa á uma nova fase do capitalismo;
“Eis que nasce um terceiro tipo de homo consumericus, voraz, móvel, flexível, liberto da antiga cultura de classe, imprevisível nos seus gostos e nas suas compras e sedento de experiências emocionais e de (mais) bem estar, de marcas, de autenticidade, de imediatismo, de comunicação”,
aborda o autor de A Felicidade Paradoxal – Ensaio sobre a Sociedade do Hiperconsumo. Nesse ritmo de consumo exagerado, cresce o vazio e o sofrimento diante da insaciedade.
“O que nos faz sofrer não é a escassez, é o excesso de oferta. Ao consumir demasiadamente, estamos sendo consumidos”,
alerta Luciano Sotero Santiago, mestre em Direito e promotor de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais. Para ele é preciso e possível resistir às armadilhas do consumo.
“O mercado aliena o meu desejo, consegue transformar valores em mercadoria. Mas posso refletir: esses valores do mercado não meus”.
Consumo no Brasil.
Segundo a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2008/09, feita pelo IBGE, a família brasileira gasta, em média, R$ 2.626,31 por mês, e as do Sudeste gastam mais (R$ 3.135,80), quase o dobro das famílias do Nordeste (R$ 1.700,26), que têm a menor despesa. Desigualdade semelhante é encontrada entre a despesa média nas áreas urbana (R$ 2.853,13) e rural (R$ 1.397,29). No Sul e no Sudeste, as famílias de menor rendimento mensal (até R$ 830,00) gastam em média mais do que recebem (R$ 929,75 e R$ 831,67, respectivamente). As despesas de consumo são o mais importante componente das despesas das famílias e representam 81,3% do total (ou R$ 2.134,77) nacional.
Educação para o consumo.
Debates como esses em torno da temática do consumo fizeram parte do II Seminário Educação para o Consumo, realizado em 29 e 30 de outubro de 2012, pela Escola Estadual de Defesa do Consumidor, do Procon-MG. Além desse evento, a Escola promove cursos e atividades voltados para a formação de professores e estudantes na temática do consumo consciente, entre eles o projeto Procon Mirim. Informações em: www.mp.mg.gov.br/procon.
Para o promotor Luciano Sotero, o professor tem um papel fundamental na formação de cidadãos mais conscientes.
“É preciso que o professor também tenha uma visão crítica. E na sociedade de consumo é muito difícil ter uma visão crítica, porque a todo momento nós somos bombardeados pela educação do capital”, alerta.
De acordo com o professor Ricardo Teixeira da Veiga, doutor em Administração e pesquisador do Núcleo de Estudos do Comportamento do Consumidor da UFMG, a educação colabora para que os cidadãos sejam mais críticos e menos sujeitos às armadilhas do consumo.
“Os caminhos para a construção de um mundo menos consumista e mais sustentável passam por estimular as pessoas para uma participação social mais construtiva, seja através da educação, da política, da ecologia, do humor e da vida baseada em valores como simplicidade, solidariedade e ética”, aponta.
Jornal Extra – Classe 139/dezembro 2012.